Às 6 horas do dia 31 de agosto de 2006 os sinos da Igreja Matriz Nossa Senhora da Conceição, no centro de Urussanga, começavam a badalar e dezenas de urussanguenses acordavam. Naquele momento os sinos anunciavam a oração da Ave Maria e o falecimento de Monsenhor Agenor Neves Marques. Era um dia que prometia ser ensolarado, marcando o último dia do mês. O dia que estará na memória de milhares de pessoas que acompanhavam o trabalho de Monsenhor, seja na fé, na comunicação, ou no seu amparo aos mais necessitados. Hoje, após 16 anos de sua morte, Monsenhor é lembrado todos os dias pelas suas ações em prol de Urussanga e região.

Nascido em 10 de outubro de 1915, Monsenhor era natural de Palhoça, no qual ingressou no seminário de Azambuja em 1927. Ordenado padre em 1940, Monsenhor chegava em terras urussanguenses sete anos depois, em 1947, onde viveu até sua morte. Visionário, padre Agenor é um dos principais nomes ligados à história de Urussanga. Comunicador, radialista, escritor, apicultor, sacerdote e político, Monsenhor foi o responsável por diversos projetos que beneficiaram e ainda beneficiam a comunidade, como a fundação do Paraíso da Criança e da Rádio Marconi, há mais de 70 anos.

Para recordar a história de vida de Monsenhor, o programa Ponto de Encontro realizou uma entrevista especial com Rosa Miotello. Rosa trabalhou junto ao padre desde 1967 a 2006, ano de seu falecimento. Uma das recordações de Monsenhor é o programa Andorinha Mensageira, o programa de rádio mais antigo de Santa Catarina, que ainda hoje faz parte da programação da Rádio Marconi. Rosa Miotello apresenta ele todos os domingos, a partir das 7 horas. Ouça a entrevista na íntegra e saiba mais sobre a história do padre Agenor:

Parte 01

 

Parte 02

 

Rosa conta que Monsenhor inovou em todas as áreas em Urussanga. Pouco mais de um ano depois da sua chegada, o sacerdote já fundava um dos seus sonhos, que era poder acolher crianças necessitadas. Em 15 de agosto de 1948, o padre seguia até a cidade de Nova Veneza para buscar três religiosas beneditinas. A busca das irmãs tinha um só objetivo: a fundação do Paraíso da Criança. O espaço funcionava como um orfanato, onde eram acolhidas crianças de famílias de Urussanga e região. “Ele tinha o orfanato, que começou a recolher as crianças, por causa da mineração. Pessoas pobres, carentes, e os mineiros faleciam, e as mulheres ficavam com aquele batalhão de filhos. E o coração do padre Agenor era um coração de pai”, comenta Rosa.

Além do Paraíso, havia também um internato, no qual as famílias, de outras regiões, pagavam para que os seus filhos estudassem e morassem ali. No mesmo espaço também tinha a Escola Paraíso da Criança, onde diversos urussanguenses puderam estudar até concluir a quarta série do ensino fundamental. A criança que concluía o ensino ganhava uma espécie de certificado, representando o fim de um ciclo. Além do orfanato, internato e escola, o Paraíso se destacava também por ter um maternal, no qual as mães podiam deixar os seus filhos pequenos para que pudessem trabalhar. Rosa ainda destaca que um estudo de uma rádio de Florianópolis concluiu que este foi o primeiro maternal criado em Santa Catarina. Tempo depois, também surgiu a Escola Profissional São José, onde muitos jovens puderam fazer cursos de datilografia, corte e costura, pintura, bordado, arte, culinária e outros.

Ainda sobre o Paraíso, Monsenhor teve a oportunidade de fazer o casamento de 29 jovens que moraram na instituição. Isso tudo foi possível devido ao vínculo paternal que existia. Rosa destaca que o padre criava diversas maneiras para que as crianças participassem ativamente das atividades da igreja. Prova disso, eram as missas semanais para as crianças, realizadas em todas as tardes de sábado. No natal, as crianças levavam os seus brinquedos favoritos para que o padre pudesse benzer eles. “A gente cantava canções com elas, infantis, era uma missa belíssima, e o padre Agenor sempre muito criativo”, relembra Rosa.

Foto: Gustavo Marques / Rádio Marconi

Não só em Urussanga, o nome de Monsenhor também se evidencia na história de outros municípios do Sul do estado. Padre Agenor foi o responsável pela criação da composição do hino de 16 cidades, entre elas Urussanga, Cocal do Sul, Morro da Fumaça e Jaguaruna. “Na época do centenário de Urussanga, quando ele fez o nosso, o pessoal vinha pedir para que ele fizesse. Claro, para fazer o hino você tem que estudar um pouco sobre a história da cidade, como a cidade nasceu, os fundadores, o estilo da cidade… e ele fez vários”, recorda Rosa. Além de suas composições, padre Agenor se destaca como escritor. “Às vezes o pessoal esquece que o padre era escritor, esquece que ele tinha as cartilhas de apicultura, ele tinha imigração italiana, ele tinha a história de Urussanga, que são livros sobre a nossa história”, comenta.

Falecimento

Foto: Reprodução / Arquivo / Portal Engeplus

Padre Agenor faleceu no início da manhã do dia 31, mas só foi sepultado na tarde do dia seguinte, no dia 1º de setembro. Seu velório aconteceu na Igreja Matriz, onde rezou milhares de missas ao longo dos quase 60 anos que esteve em Urussanga. De acordo com Rosa, a morte do padre não foi repentina, já que ele estava há vários dias doente na cama, comunicando-se por gestos e bilhetes escritos à mão. “Ele fazia os bilhetinhos dele: ‘Rosa, quando eu morrer eu quero ser enterrado de roupa branca’”, comenta Rosa, que acrescenta que esse desejo não pode ser realizado devido à aparência de Monsenhor, no qual foi sepultado usando a tradicional batina preta, com sobrepeliz branca e com a estola com um ramo de flores e uma abelha bordados.

O sepultamento de Monsenhor aconteceu às 16 horas do dia 1°, após a chegada de Dom Paulo, bispo da diocese, que estava em Chapecó. Cada minuto antes da cerimônia de sepultamento foi marcado por celebrações, orações, homenagens e recordações de histórias. Rosa ainda lembra que foram feitos banners e cartazes com fotos do padre para enfeitar a igreja. Além disso, foram feitas mais de 5 mil lembranças e bandeirinhas com fotos do padre e com versos que ele tinha escrito. “Foram mais de 100 corbélias”, comenta. Rosa lembra que o padre dizia que não queria flores, então as corbélias foram cortadas e cada flor foi dada a todas as pessoas que estavam no velório. “Nem o verde sobrou, cada uma levava uma flor, só sobraram as corbélias vazias”, completa.

Monsenhor foi sepultado no Cemitério Municipal de Urussanga. Algumas pessoas, inclusive funcionários da Rádio Marconi na época, carregaram o caixão do padre em um cortejo. “Nós saímos com o caixão do padre ali da casa, descemos até a praça e subimos a escadaria da igreja. A gente achou que era importante eles fazerem esse trajeto, não é? Ele deu a vida por esse povo, ele ensinou esse povo, ele lutou por esse povo”, frisa Rosa. Nesta quarta-feira, dia 31, completam-se 16 anos desse dia. Mesmo com o passar dos anos, o legado de Monsenhor Agenor está marcado na vida de muitas pessoas, sejam por aqueles que o acompanhavam nas missas, no rádio, em seus livros ou nos trabalhos sociais.

Foto: Reprodução / Arquivo / Portal Engeplus

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Produção e edição: Gustavo Marques

Por Karine Possamai Della / Rádio Marconi FM