Uma comunidade terapêutica em Laguna foi interditada após uma vistoria conjunta realizada pelo Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), Polícia Militar, Corpo de Bombeiros Militar, Vigilância Sanitária e Secretaria de Assistência Social do Município na última quinta-feira, dia 14. A operação foi divulgada nesta segunda-feira, dia 18. Na visita, organizada pela 3ª Promotoria de Justiça da Comarca, foi possível constatar inúmeras irregularidades, como indícios da prática de tortura e cárcere privado.

Com a interdição, os 49 acolhidos foram retirados do local com apoio da assistência social, que auxiliou nos contatos com as famílias e encaminhamentos socioassistenciais. Três homens apontados como responsáveis pela comunidade foram presos em flagrante pelas Polícias Militar e Civil, suspeitos da prática dos crimes de sequestro e cárcere privado. Em audiência de custódia, a pedido da 2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Laguna, as prisões em flagrante foram convertidas em prisões preventivas.

Condições precárias e cárcere privado

Durante a vistoria, diversos acolhidos afirmaram que foram levados e estavam no local contra vontade e que sete deles eram mantidos em cárcere privado. Eles mostraram à equipe um quarto onde ficavam presos praticamente 24 horas por dia. Conforme o relato, a porta do cômodo ficava trancada e do lado de fora um monitor vigiava a saída. Eles contaram, ainda, que faziam todas as refeições dentro do quarto, dividiam um banheiro e eram constantemente agredidos.

Ainda conforme relato dos acolhidos, medicamentos controlados eram utilizados para dopar os internos recém trazidos à força. Inclusive, no momento da vistoria, foi verificado pela equipe que havia dentro do quarto um interno totalmente dopado. O homem precisou de atendimento emergencial do Corpo de Bombeiros, que o transportou para atendimento hospitalar.

Conforme observado pela equipe do programa, no quarto havia beliches e apenas dois ventiladores. A única ventilação natural vinha de uma janela gradeada. Nas paredes do cômodo havia marcas de sangue, que, segundo os internos, eram decorrentes de agressões sofridas no local. Na parte externa do dormitório, foi encontrado um pedaço de madeira que, segundo os acolhidos, era usado como instrumento de tortura.

Além disso, a Comunidade Terapêutica não possuía responsável técnico, alvará sanitário, de funcionamento e projeto de prevenção de incêndio aprovado. Também estava superlotada e desrespeitava diversas outras normas sanitárias de funcionamento. As irregularidades ensejaram a interdição do local tanto pela Vigilância Sanitária quanto pelo Corpo de Bombeiros.

O boletim de ocorrência registrado pela Polícia Civil relata, ainda, que, no carro de um dos responsáveis pela comunidade terapêutica, foram encontrados um porrete de metal, um par de algemas e um facão. Além disso, foi encontrada uma bolsa contendo diversas cartelas de medicamentos controlados.

“Em mais esta vistoria, foram constatadas graves violações não só às normas que regulamentam o funcionamento das Comunidades Terapêuticas, mas aos direitos individuais dos internos, com a realização de `resgates¿ forçados, manutenção dos internos no local trancados contra suas vontades e relatos e evidências de agressões físicas”, detalha a Promotora de Justiça Bruna Gonçalves Gomes sobre a situação da comunidade terapêutica.

A Promotora de Justiça lembra que o acolhimento em comunidades terapêuticas precisa ser voluntário e não forçado, como ocorria no local. “As Comunidades Terapêuticas são destinadas a acolher, sempre de forma voluntária, usuários e dependentes de álcool ou drogas, pelo prazo máximo de nove meses “, completa.

Saúde Mental em Rede

A ação faz parte do programa Saúde Mental em Rede, desenvolvido pelo Centro de Apoio Operacional da Saúde Pública do MPSC. O objetivo das fiscalizações é verificar possíveis irregularidades e buscar garantir a eficiência dos atendimentos oferecidos por comunidades terapêuticas. O programa, que entre outras atividades presta apoio às Promotorias de Justiça, resulta de um termo de cooperação técnica entre o Ministério Público, a Vigilância Sanitária Estadual, a Secretaria de Estado da Saúde, o Corpo de Bombeiros Militar, o Conselho Regional de Psicologia e o Conselho Estadual de Entorpecentes.

Com informações do MPSC