O prefeito de Urussanga, Luís Gustavo Cancellier (PP), seu irmão gêmeo, ex-funcionários da prefeitura, além de engenheiros e empresários, são réus e respondem por quatro crimes. Os crimes são decorrentes das investigações que desencadearam a Operação Benedetta da Polícia Federal, em maio do ano passado, que resultou no afastamento de Cancellier do cargo por quase 13 meses. No mesmo dia que Cancellier retornou à prefeitura, na quarta-feira, dia 15, a Justiça quebrou o sigilo do processo.

De acordo com o Ministério Público Federal, os doze envolvidos são:

  1. O prefeito Luís Gustavo Cancellier;
  2. O irmão gêmeo do prefeito, Silvio Luis Cancellier;
  3. A ex-chefe de gabinete, Aleckssandra Maccari Rodrigues;
  4. A ex-contadora da prefeitura, Cimara Furlan Redivo;
  5. O ex-secretário de Infraestrutura, Émerson Jeremias;
  6. O representante da empresa Litoral Sul, Arthur Bianchini Hertel;
  7. O sócio e representante da empresa F. Aguiar, Thiago Fellipe;
  8. O sócio administrador da empresa Via Norte, Thiago Rosso;
  9. O sócio administrador e representante da empresa Correa Nunes, Márcio Correa Nunes;
  10. O sócio administrador da empresa MW Prestadora de Serviços, Carlos Alberto Golombiescki;
  11. O representante da empresa MW Prestadora de Serviços, Akilson Mota Barbora;
  12. O engenheiro, Euclides Sabino Missagia.

Clique aqui e confira o documento na íntegra

A Operação Benedetta foi deflagrada em Urussanga com o objetivo de averiguar possível má aplicação de recursos públicos contratados por município com a Caixa Econômica Federal para o financiamento de despesas. Duas obras foram analisadas, sendo a Estrada Geral do Rio América Baixo (UR-21) e a rua Silvio Ferraro, no bairro Da Estação, que utilizavam verbas do Financiamento à Infraestrutura e ao Saneamento voltado ao Setor Público (Finisa).

Entenda sobre os crimes

Organização criminosa

De acordo com o processo, entre início de 2019 a dezembro de 2020, os onze (Luís, Silvio, Cimara, Aleckssandra, Arthur, Émerson, Thiago Fellipe, Thiago Rosso, Márcio, Carlos e Akilson) envolvidos “em comunhão de esforços e unidade de desígnios, constituíram e integraram, pessoalmente, organização criminosa, associando-se, de modo ordenado e com divisão de tarefas, com o objetivo de obter, direta e indiretamente, vantagens, inclusive financeiras, mediante a prática de crimes de responsabilidade do Prefeito, de crimes contra a administração pública e a fé pública”, afirma o documento.

Conforme o MP, a organização criminosa era chefiada pelo prefeito e seu irmão gêmeo. O documento afirma que o prefeito autorizou o seu irmão, de total confiança, mas que não tinha vínculo oficial com a prefeitura, para que atuasse no controle da prestação de serviços nas duas obras da cidade que usavam o Finisa.

O documento diz que Silvio era o responsável por compilar as horas trabalhadas das máquinas, a partir das informações anotadas por estagiários, repassando as informações e dados totais para a contadora da prefeitura, a Cimara. “O acusado Sílvio era a única pessoa que detinha o conhecimento e controle da totalidade dos dados sobre as horas de serviços prestadas”.

O documento ainda consta que a prefeitura contratou engenheiros de fora, mesmo que a administração já tivesse um engenheiro. Euclides Sabino Missagia e o denunciado Arthur foram contratados para assumir a responsabilidade técnica da execução e fiscalização da obra. Euclides foi contratado para assinar as Anotações de Responsabilidade Técnica (ART’s), formalmente, mas não assumindo sua função de responsável técnico. O MP afirmou que ele visitava as obras, no qual disse ter feito a cada 15 dias, mas se houvesse algum problema era para tratar do assunto com o secretário de Infraestrutura, o Émerson.

Consta no documento que o denunciando Arthur, também engenheiro e titular da empresa Litoral Sul, foi o responsável pelos projetos básicos e executivo, além de realizar o levantamento técnico necessário para fazer as obras e os cursos. Arthur também assumiu a responsabilidade técnica de fiscalizar o andamento das obras.

O secretário Émerson era quem comandava a execução dos trabalhos no canteiro de obras, “fiscalizando diariamente in loco a movimentação das máquinas e dispondo de estagiários que anotavam as horas trabalhadas. Cabia-lhe preencher as planilhas de acompanhamento da obra da Rua Sílvio Ferraro, com base nos registros feitos pelos estagiários, e entregar tal planilha para o denunciado Sílvio, responsável pela compilação dos dados. Ademais, o denunciado Émerson fiscalizava todas as demais obras que estavam sendo realizadas no município”.

O Ministério Público ressalta que o grupo contava com a participação de servidores de confiança de dentro da prefeitura. A contadora Cimara era responsável por analisar as planilhas das horas trabalhadas e autorizar o pagamento de serviços prestados para a prefeitura com recursos do Finisa.

Já a chefe de gabinete, Aleckssandra, era responsável por concentrar as informações sobre as ocorrências externas e o gabinete do prefeito. Ela ainda acompanhava a frequência do irmão Silvio à prefeitura, além dos contatos com os empresários. O MP afirma que Aleckassandra agia sob ordens diretas do prefeito Cancellier, sendo ela a responsável por responder as solicitações dos vereadores, impedindo o acesso de dados informações sobre as duas obras investigadas.

Durante as investigações, os peritos da Polícia Federal identificaram o superfaturamento de horas-máquinas, além da má qualidade do serviço prestado, já que foi notado trechos de asfalto que apresentavam rachaduras e buracos. Também foi apurado que as empresas contratadas emitiam notas fiscais apontando quantidades e valores que não estavam de acordo com o que era executado. “Tais notas eram chanceladas pelo fiscal da obra, denunciado Emerson Jeremias, e pelo próprio gestor municipal, denunciado Luiz Gustavo Cancellier, o que permitia a liquidação de pagamentos superfaturados com desvio de verba pública federal”.

Sonegação de documentos

O documento ainda diz que em três oportunidades de 2019 a 2020, o prefeito e seu irmão gêmeo, o secretário de Infraestrutura, a chefe de gabinete e a contadora da prefeitura, sonegaram documentos e informações sobre os gastos das duas obras que eram solicitados pelo então suplente de vereador, Julio Cesar Bonetti, e pelo vice-prefeito, Décio da Silva.

Quando solicitavam as informações, a prefeitura respondia que “todas as informações sobre gastos nas obras executadas no município, informando valores, fornecedores, números das notas fiscais e demais informações encontram-se disponíveis no Portal da Transparência”.

Julio foi um dos responsáveis por fazer a representação sobre o caso na Polícia Federal: Confira aqui a entrevista de Julio

O vice-prefeito, Décio da Silva, também solicitou acesso aos dados e informações sobre os custos das duas obras. Décio tentou ver as informações com uma estagiária da prefeitura, sendo que ela respondeu que só passaria se fosse autorizada pela chefe de gabinete, a Aleckssandra.

“A oportunidade o Vice-Prefeito em exercício alertou o Prefeito, ora denunciado, sobre a sonegação de informações e documentos e relatou a suspeita de irregularidades, sugerindo a abertura de processo interno de investigação sobre a execução dos contratos de hora-máquina para que se apurasse se as empresas contratadas estavam cumprindo o quanto acordado, conforme se lê do e-mail juntado aos autos. O denunciado Luis Gustavo Cancellier nada fez”.

Falsidade ideológica

De março de 2019 a dezembro de 2020, os onze denunciados teriam prestado “declarações falsas em documentos públicos a cada prestação de contas à Caixa Econômica Federal com a finalidade de criar obrigação e alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante, quais sejam, as quantidades e os valores dos serviços prestados que não conferiam com aqueles efetivamente executados, justificando o pagamento maior em favor das empresas contratadas pela Prefeitura para executarem as duas obras em foco, Rua Sílvio Ferraro e acesso lateral e UR21”.

Além disso, as investigações apuraram que a prefeitura de Urussanga contatou engenheiro fora do quadro de servidores para ser o responsável pelas duas obras. O engenheiro Euclides Sabino Missagia teria inserido declaração falsa nas ART’s que assinou, criando e alternando a verdade sobre ser o engenheiro responsável. “A falsidade ideológica perpetrada pelo denunciado Euclides servia aos interesses da organização criminosa, porquanto formalmente mantinha um engenheiro responsável pelas obras, um testa de ferro, mas de fato contava com a atuação do denunciado Arthur na condução dos projetos e na execução das obras, promovendo esse as alterações dos valores e dos traçados, conforme a conveniência dos associados criminalmente”.

Conforme o documento, “os denunciados Jeremias e Luís Gustavo tinham plena ciência de que o engenheiro contratado para assinar as ART`s não era efetivamente o responsável técnico pelas obras em foco, não se reportavam a Euclides para elaborar os projetos ou acompanhar a execução das obras, nem para alterar valores ou traçados originariamente previstos. Permitiram que Euclides acompanhasse de longe a movimentação no canteiro de obras, mantendo-o distante da condução efetiva dos trabalhos. Esse sistema servia aos interesses do grupo: ao mesmo tempo em que era formalmente responsável técnico, evitavam que Euclides tomasse conhecimento dos valores e quantitativos efetivamente movimentados, porquanto discrepantes com a realidade, conforme demonstrado pelas perícias anteriormente referidas”.

Desvio de verba pública federal

Entre março de 2019 a dezembro de 2020, os onze envolvidos teriam desviado, em proveito próprio, o valor de R$ 308.152,42, relativo à obra de pavimentação na rua Silvio Ferraro e acesso lateral. Conforme o MP, essa obra possui um superfaturamento de 161%, segundo os laudos periciais.

A empresa Litoral Sul fez o projeto da obra em abril de 2019. No projeto, o asfaltamento da rua Silvio Ferraro, de quase 700 metros, custaria R$ 591.801,15. Porém, conforme o “relatório de apresentação de dados”, a obra custou ao final R$ 1.059.502,2. O engenheiro Arthur afirmou que a diferença era por conta do reajuste das tabelas de custo, como forma de justificar o desvio de dinheiro.

De acordo com a denúncia, na mesma época, durante as obras da rua Silvio Ferraro, os onze denunciados desviaram R$ 25.040,51 de verba pública federal em favor de Arnaldo Masiero, ao permitirem a construção de acesso asfaltado na propriedade particular e a realização de aterros em uma propriedade rural.

Já na obra da pavimentação da Estrada Geral Rio América Baixo, houve desviou de R$ 355.390,46 de verba pública. Os laudos periciais afirmam que houve um superfaturamento de 1.076% na realização da obra.

Tabela: Denúncia do Ministério Público Federal
Tabela: Denúncia do Ministério Público Federal

Com isso, nas duas obras, houve o superfaturamento de R$ 663.542,91 total nas duas obras. Por isso, o MP colocou esse valor como reparação dos danos caso os doze envolvidos sejam condenados pela justiça.

Andamento dos processos

Na última quarta-feira, dia 15, o prefeito Luis Gustavo Cancellier retornou ao cargo após a liminar do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O prefeito estava afastado há quase 13 meses. É importante ressaltar que, mesmo com o retorno, Cancellier, assim como os outros dez envolvidos, ainda são réus dos quatro crimes apontados pelo Ministério Público Federal. Desde maio do ano passado todo o processo da Operação Benedetta estava em segredo de justiça, sendo que o segredo foi liberado no mesmo dia em que o prefeito retornou ao cargo.

Um novo pedido de abertura de Comissão de Investigação e Processante (CIP) foi protocolado na Câmara de Vereadores na última semana. Julio Cesar Bonetti solicita que o Legislativo apure o caso contra Cancellier. Saiba mais aqui.

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