Seja pelo álcool, drogas ou cigarro, a dependência química afeta diversas áreas da vida da pessoa. Para o psicólogo Edemilson Mariot, a dependência pode ser caracterizada como uma doença crônica. “Ela acaba vindo e progressivamente ganhando espaço na medida que o sujeito não trata”, salienta. “O grande desafio do tratamento da dependência química é justamente isso. Primeiro, a gente pensar que ela é uma doença multifacetada, não envolve só aspectos biológicos, então só tratamento com medicação não trata, só mudança comportamental não trata. Então, são todas essas facetas que a gente tem que pensar no momento que vai empreender tratamento”, complementa.
Por ser progressiva, o dependente químico tende a ter prejuízos, sejam financeiros, sociais ou mentais, tanto para ele como para as pessoas que convivem com ele. “Existe uma escala, digamos assim, social que foi criada, das drogas mais aceitas e leves e das drogas mais pesadas, quando que para o dependente químico não tem droga mais leve, droga mais pesada, ele não pode usar, tanto as lícitas quanto as ilícitas”, afirma. Para abordar mais sobre o tema, o psicólogo Edemilson participou de uma entrevista especial no programa Ponto de Encontro. Ouça na íntegra e saiba mais:
Parte 01
Parte 02
O psicólogo destaca que a droga, álcool e cigarro são democráticos, ou seja, podem atingir todas as pessoas. “Os preconceitos de achar que a dependência química e o uso de droga está relacionada a uma cultura periférica. A droga é democrática, ela não aceita linhas nos mapas, ela não aceita linhas definidas pelos economistas de classe. Ela está tanto nas classes menos favorecidas financeiramente até na outra ponta, nos mais abastados”, comenta. Segundo Mariot, esses pensamentos preconceituosos acabam prejudicando as pessoas que estão sofrendo pelo vício. Isso porque há uma ideia errada de que o dependente químico é menos favorecido e que está em situação de rua, por exemplo. “Muitas vezes ele não tem problemas sociais do ponto de vista do tipo de morar na rua, mas a vida dele está destruída na família, ele já não tem mais crédito com os familiares, ou já não se relaciona mais com os filhos”, observa.
Edemilson explica que o consumo de bebidas, drogas ou cigarro estimula o sistema de recompensa dos dependentes, gerando a sensação de prazer. “A dependência química, a doença, pode estar previamente instalada, digamos assim, no indivíduo, por condições genéticas ou por uma própria baixa produção de dopamina e serotonina, e aí o indivíduo vai tentar compensar isso, muitas vezes ele vai ter uma experiência isolada, vai ser positiva, e ele vai ao longo de anos tornar aquilo um hábito até ao ponto de ele realmente depender daquilo para poder viver”, esclarece. O especialista ainda frisa sobre o uso, abuso e a dependência das substâncias, no qual uma pessoa sempre inicia pelo uso, geralmente socialmente. “É sempre delicado falar, porque como a dependência química é progressiva, a maioria das pessoas começa usando socialmente”, pontua.
Sobre um tratamento, Edemilson reforça que não existe uma receita pronta. Conforme o psicólogo, os estudos recentes mostram que os tratamentos atuais não possuem 100% de assertividade. “Ainda depende muito da motivação do sujeito, da aceitação e do desejo de parar. Então assim, muitas vezes essa abordagem vai ter que ser leve, vai ter que começar aos poucos, vai ter que ser progressiva, não vai ter que ter julgamentos, brigas, discussões, e aos poucos mostrar para o sujeito a possibilidade de que ele pode ter uma outra forma de viver”, comenta.
Além disso, o especialista conta que o dependente químico possui dificuldades para formar memória de trauma. Muitas vezes, ele próprio ou sua família está sofrendo por conta da dependência e ele não percebe o problema. “Ele sai, ele bebe, ele briga, ele se machuca, ele se endivida, ou a família está lá em casa chorando, em condições muitas vezes terríveis, deploráveis. Ele mesmo se põe nessa condição de ser muitas vezes uma pessoa respeitada socialmente e vai ao ponto de morar na rua, e ele não consegue formar memória de trauma. Isso é uma questão neurológica e todos esses traumas não conseguem fazer ele parar, então tem essas questões relacionadas aos problemas cognitivos que o uso e abuso de substâncias, de drogas, vai causar no cérebro do indivíduo”, declara.
O psicólogo assegura que o primeiro passo é o dependente químico aceitar a sua condição e pedir ajuda, seja para a família, amigos ou no sistema público de saúde. Por ser uma doença multifacetada, seu tratamento também deve ser multifacetado. Conforme Edemilson, há tratamentos com o uso de medicamentos, que irão diminuir a ânsia e o impulso pela bebida ou droga; as terapias ocupacionais, que irão auxiliar o paciente a lidar com o vício; além de clínicas, que podem ajudar como métodos de desintoxicação.